Os espaços materiais e simbólicos que habitamos, as suas estéticas e a sua organização contam-nos histórias sobre quem somos, definem o nosso lugar e o dxs outrxs. Quem teve o poder de inscrever estas narrativas e de ordenar estes lugares assume também o poder de estruturar o futuro, aquilo a que cada um/a pode almejar, os formatos das nossas relações.
A história pós-Colombo foi construída com base numa ideia de globalização e progresso unilateral, racista, antropocêntrica, capitalista, patriarcal e heterossexista, e o pós 2ª guerra criou uma ilusão de fraternidade e igualdade, sem que a ordem do poder fosse na verdade disputada. A ordem que até aqui reconhecemos parte do norte global, coloca-o e à sua linhagem no centro, definindo a partir deste as margens e estratificando-as. Este modelo esmaga e apaga a diversidade, distorce a sua presença histórica, confabula a normalidade e prescreve soluções competitivas de felicidade e de sucesso individual. Neste processo impede a resiliência das comunidades e a criatividade individual e colectiva, repete obsessivamente o erro anulando e oprimindo todxs aquelxs cuja cor da pele, cultura, religião, género e sexualidade, ou modelo de desenvolvimento desafia o poder e o status quo.
Este modelo colonial de sociedade e produtividade está em crise. A pandemia forçou o confronto com a falência dos critérios tradicionalmente usados – trabalho, dinheiro, património - para organizar os espaços de participação e os grandes propósitos de vida, sejam estes globais e individuais. Estaremos preparados para construir um novo capítulo? É possível pensar o futuro, garantir que é inclusivo, justo e sustentável, que é mais do que uma redundância do passado, sem saber quem somos no espelho da história? Sem recuperar outras histórias, o conhecimento, xs protagonistas que perdemos ou atropelámos? Haverá futuro fazível sem plurividência?
Nesta MICAR, voltaremos a procurar as vozes e corpos cuja memória e visão tem sido mantida nas margens, para descobrirmos quem somos e para onde queremos ir. Exploraremos o lugar das mulheres, dxs jovens e da arte na transformação social. Para com elxs e através delxs resgatar o direito à memória passada, descolonizar a ordem do mundo e reivindicar o direito ao futuro!