Quinta-feira | 30 de Outubro 2025
KORA de CLÁUDIA VAREJÃO | Portugal | 2024 | Documentário | 27min | M/12
Curta-metragem documental que traça o retrato de cinco mulheres refugiadas a viver em Portugal: Inna (Ucrânia), Norina (Afeganistão), Zohra (Sudão), Margarita (Rússia) e Lana (Síria). Através de um coro de vozes, gestos e memórias guardadas em fotografias, Kora desenha um retrato íntimo e político da reconstrução do presente destas mulheres. Alternando entre preto-e-branco e cor, as cinco vinhetas deixam transparecer a tensão entre pre- sença e ausência, identidade e invisibilidade, num olhar solidário de Varejão sobre as marcas do passado no corpo e nas palavras — e sobre como se forjam laços afetivos, mesmo diante da perda e do confinamento emocional.
Kora é um filme sobre a migração forçada, a resiliência feminina e as experiências de identificação num novo país. Dá voz a narrativas silenciadas, e celebra a capa- cidade de recomeço — lembrando-nos que acolher é reafirmar dignidade.

Sexta-feira | 31 de Outubro 2025

MICARzinha | Manhã | Sessões para os 1ºe 2º ciclos e Secundário
NÓS SOMOS HUMANOS de TURMA 2.ºB 2024/25 E. B. COSTA CABRAL no âmbito das oficinas ANILUPA, da Associação de Ludotecas do Porto | Portugal | 2025 | Animação | 6min | M/6 | Português
ON A SUNDAY AT ELEVEN de ALICIA K. HARRIS | Canadá | 2024 | Ficção | 9min | M/6 | Inglês
AS RAÍZES DO MEU CABELO de LOU LOUÇÃO | Portugal | 2020 | Experimental • Biografia | 6min | M/6 | Português
PERSEPOLIS de VINCENT PARONNAUD MARJANE SATRAPI | França • EUA | 2007 | Animação • Biografia | 1h 36min | M/12 | Francês • Inglês • Persa • Alemão
Adaptação da novela gráfica autobiográfica de Satrapi ao grande ecrã, Persepolis acompanha Marjane dos 8 aos 22 anos, desde a infância em Teerão durante a Revolução Islâmica no final dos anos 1970, passando pelo exílio na Áustria durante a adolescência, até ao regresso a casa já jovem adulta. Num alto contraste a preto-e-branco, a animação expõe as dores de crescimento da autora, a to- mada de consciência política, e feminista, as saudades de casa e o sabor doce e amargo desses regressos ao passado.
Persepolis é um poderoso exercício de equilibrismo entre humor e gravidade, num itinerário pessoal que testemunha represálias políticas, resistência contra a opressão, a liberdade nas brechas de uma ditadura, a experiência da migração forçada e a busca de identidade entre Teerão e a Europa.


ABRAÇAMOS SONHOS, SUPERAMOS BARREIRAS! de SALVADOR GIL | Portugal | 2024 | Documentário | 29min | M/6 | Português
A Letras Nómadas — Associação de Investigação e Dinamização das Comunidades Ciganas, no âmbito do Projeto FAPE 23/2024, desafiou o português cigano Salvador Gil a realizar este documentário — um objeto que, através de pequenas entrevistas, enquadra a génese e mostra os resultados de dois programas de afirmação positiva na área educativa: OPRE e ROMA Educa.
Abraçamos Sonhos… procura inspirar outros jovens ciganos/as para novos percursos escolares, e quebrar estigmas e preconceitos. Celebra, ainda, a resiliência de dirigentes associativos e ativistas, técnicos, jovens estudantes e suas famílias, que não desistem em retirar da instrução escolar ferramentas para conseguirem su- perar melhor as ‘barreiras do preconceito’ que lhes são impostas pela sociedade.
DAYDREAM THERAPY de BERNARD NICOLAS | EUA | 1977 | Experimental | 8min | M/6 | Inglês
Daydream Therapy é um curto manifesto criado em 1977 por Bernard Nicolas, enquanto estudante da UCLA, parte do movimento L.A. Rebellion — Los Angeles School of Black Filmmakers. Díptico a preto-e-branco e a cores, entre realidade e utopia, o filme combina a poderosa rendição de Pirate Jenny por Nina Simone, com o sa- xofone de Archie Shepp, em Things Have Got to Change, seguindo uma trabalhadora negra de hotel que, exausta, recorre a sonhos vívidos como fuga às indignidades do quotidiano laboral, onde sexismo e racismo marcam a sua experiência diária.
Ao transformar a rotina em fantasia política, Daydream Therapy entrega um testemunho poético e visceral do desgaste emocional e do despertar da consciência so- cial. A sua fantasia revela tanto a dor do dia a dia, como a força da imaginação enquanto espaço de resistência— um reflexo do cinema da L.A. Rebellion, que cruza indignação política com desejo de justiça e visibilidade.
NATIONALITÉ: IMMIGRÉ de SIDNEY SOKHONA | França • Mauritânia | 1976 | Docuficção | 1h 25min | M/12 | Francês • Árabe
Documentário híbrido — entre ficção, registo real e ensaio cinepoético — filmado entre 1972 e 1975 por Sidney Sokhona, artista mauritano imigrado em Paris, e futura figura política. Narrado pelo próprio, o filme acompanha a chegada a França de Sidi, um operário mau- ritano, a sua integração forçada em trabalhos penosos, o confronto com o racismo institucional e a exploração nas habitações coletivas da Rue Riquet. Este ‘cinema-arma’, revela as primeiras manifestações e os círculos de solidariedade entre trabalhadores migrantes, num retrato vivo das tensões sociais e da consciência coletiva crescente na França dos anos 1970.
Restaurado em 2024 pela Cinémathèque Afrique — Institut Français, em parceria com a associação Talitha e o próprio Sokhona, a partir dos elementos em 16 mm originais, Nationalité: Immigré reforça a urgência de escutar narrativas históricas de resistência — e chega a 2025 com uma inquietante atualidade.


BLKNWS: TERMS & CONDITIONS de KAHLIL JOSEPH | EUA | 2025 | Ficção Científica | 1h 50min | M/16 | Inglês
BLKNWS: Terms & Conditions apresenta-se como uma enciclopédia audiovisual da cultura negra, estrutura- da em 21 entradas que fundem arquivo, ensaio, ficção científica e reinterpretações históricas. Navegamos por narrativas transatlânticas — da escravatura à reinvenção afrofuturista — onde ideias de W.E.B. Du Bois, Marcus Garvey e Saidiya Hartman convivem com excertos de arquivo e cenas encenadas num ‘novo’ navio transatlântico. O ritmo, ora acelerado, ora hipnótico, próximo de um álbum musical, combina imagens de diferentes fontes para criar uma experiência imersiva que atravessa géneros e temporalidades.
BLKNWS explora a diáspora negra como arquivo vivo e gesto de resistência. A sua construção em ‘faixas’ enciclopédicas, onde o real e o imaginado se cruzam, revela como a memória e a ficção se tornam ferramentas de reconstrução identitária e crítica às estruturas raciais e coloniais.
Sábado | 01 de Novembro 2025
Manhã | Sessão Famílias
EU, CAPITÃO de MATTEO GARRONE | Itália • Bélgica • França | 2024 | Drama | 2h 01min | M/12 | Wolof • Francês • Árabe • Inglês • Italiano
Eu, Capitão acompanha Seydou e Moussa, dois primos de 16 anos que partem de Dakar rumo à Europa, movidos pelo sonho de se tornarem músicos em Itália. A viagem, filmada com realismo e momentos de lirismo visual, atravessa o deserto do Saara, centros de detenção na Líbia e a travessia do Mediterrâneo. Matteo Garrone propõe um olhar íntimo sobre a experiência migratória de menores não acompanhados, guiado pelo ponto de vista dos protagonistas, e por episódios que oscilam entre o brutal e o fantástico — como visões que flutuam entre o trauma e a esperança.
Pensado para a Sessão Famílias, Eu, Capitão é a pro- posta da MICAR para pais, filhos e tutores partilharem uma história comovente sobre coragem, dignidade e sonho. Um convite a conversas intergeracionais sobre migração, empatia e o direito universal a imaginar um futuro diferente.


FRUTO DO VOSSO VENTRE de FÁBIO SILVA | Portugal | 2021 |Documentário | 20min | M/6 | Português
Generosa primeira obra de Fábio Silva, Fruto do Vosso Ventre parte da descoberta de cassetes 8 mm familiares para pensar sobre as imagens que antecedem o seu nas- cimento. Ao regressar à casa onde cresceu e investigar os silêncios herdados dos pais cabo-verdianos, o realizador procura compreender traumas antigos e afetos nunca ditos. Com um registo honesto e corajoso, Silva constrói um retrato íntimo onde o arquivo pessoal ganha espessura política, revelando como a memória visual ajuda a recompor identidades fragmentadas.
Fruto do Vosso Ventre é um filme sobre herança, cura e descoberta. A travessia entre passado e presente reativa a relação pai-filho e reconstrói narrativas familiares, mostrando a memória como ferramenta de libertação — um gesto de resistência íntima que ecoa nas experiências da migração e do pertencimento.
NHA MILA de DENISE FERNANDES | Portugal • Suíça | 2020 | Ficção | 18min | M/6 | Crioulo • Português
Depois de 14 anos longe da sua terra natal, Salomé precisa regressar à Ilha de Santiago, em Cabo-Verde, para se despedir do irmão, moribundo. Durante uma escala no aeroporto de Lisboa, Águeda, uma empregada de limpeza, reconhece Salomé como Mila, sua amiga de infância, e convida-a para passar o tempo de espera com a sua família, que a aguarda em casa. O bairro torna-se palco de uma viagem espiritual, que confronta Salomé com memórias dolorosas e o vínculo ambíguo com Santiago. Nha Mila é um filme sobre regresso, memória e pertença. Através da reaproximação com o passado e a comunidade, Denise Fernandes explora as tensões da diáspora, o reencontro com a ancestralidade e a com- plexidade das ligações afetivas entre quem migra e as suas raízes.
SABURA de FALCÃO NHAGA | Portugal | 2025 | Ficção | 26min | M/6 | Português
Sabura é uma história de amor entre dois jovens africanos, Cadija e Tony, que tentam reconstruir a sua existência em Lisboa, num lar partilhado por migrantes, onde convivem a esperança e a distância, o aconchego e o deslocamento. Entre a nostalgia do passado e a dureza do presente, Sabura capta com sensibilidade os olhares, as cumplicidades e os momentos de intimidade que transformam o lar num espaço de pertença e humanidade. O título, em crioulo guineense, atira para “contentamento” ou “deleite”, uma referência pessoal de Falcão Nhaga que traz à memória a infância e a terra natal, por vezes encontrada na doçura de um pêssego.
Sabura é o reencontro consigo mesmo em territórios de incerteza. Um convite a escutar os olhares e histórias que insistem em existir, apesar das invisibilidades e dos desafios da diáspora.
TO A LAND UNKNOWN de MAHDI FLEIFEL | Reino Unido • Grécia • Dinamarca • Países Baixos • Palestina • França • Alemanha • Arábia Saudita • Catar | 2024 | Drama | 1h 45min | M/18 | Árabe • Inglês • Grego
Em Atenas, dois primos palestinianos, Chatila e Reda, vivem presos no limbo da migração irregular, sobrevivendo entre biscates, pequenos delitos e promessas quebradas, enquanto sonham chegar à Alemanha para abrir um café. Quando decidem ajudar um rapaz palestiniano a atravessar clandestinamente para Itália, por meio de uma triangulação arriscada, a linha entre esperança e desespero torna-se mais ténue — e o gesto criminoso cada vez mais a única possibilidade de sobrevivência. Livremente inspirado em Men in the Sun, de Ghassan Kanafani, o filme reencena o clássico da literatura palestiniana à luz das fronteiras europeias contemporâneas.
To a Land Unknown é um retrato cru da deslocação forçada e das vidas suspensas entre geografias e pertenças. Entre amizade, exaustão e gestos de solidariedade, Mahdi Fleifel entrega uma obra urgente sobre o preço da dignidade e o absurdo da espera, num continente onde a travessia é, vezes demais, o destino em si.


LETTERS FROM WOLF STREET de ARJUN TALWAR | Polónia • Alemanha | 2025 | Documentário | 1h 27min | M/6 | Inglês • Polaco
Num bairro de Varsóvia, Arjun filma a rua onde vive e escreve cartas ao amigo com quem ali chegou, anos antes — e que já não está. Migraram juntos da Índia para a Polónia, para estudar Cinema e Pintura. Através de singelos olhares ao redor, vozes da vizinhança, comércio local, luzes nas janelas e rotinas partilhadas, compõe-se um diário fílmico feito de vinhetas ternas e imagens de uma solidão silenciosa. Um cinema que evoca o gesto de Agnès Varda, onde o quotidiano se torna testemunho e, cada detalhe, uma forma de afeto.
Filmado num país marcado pela ascensão do discurso de extrema-direita e da xenofobia, Letters from Wolf Street afirma a resistência através do cuidado e da ideia de comunidade. Nos seus afetos, Talwar desenha também um importante espectro da migração: da mais à menos privilegiada, lembrando que todos temos o mesmo direito a existir — e a ser felizes — independentemente de onde chegamos.
PIDIKWE (RUMBLE) de CAROLINE MONNET | Canadá | 2025 | Performance | 10min | M/6 | N/A
Festim audiovisual, entre dança tradicional e contemporânea, Pidikwe convoca mulheres indígenas de várias gerações para um ritual de reapropriação do corpo e da imagem. Filmado em 16mm, a coreografia funde passa- do e futuro, memória e libertação, evocando a embriaguez dos anos 1920 como espelho crítico do presente. Entre brilhos, pulsação rítmica e movimentos poderosos, Caroline Monnet cria um espaço de performance onde se desfazem os estereótipos do olhar colonial — e onde as mulheres tomam de volta a narrativa dos seus corpos.
Numa linguagem que funde cinema e ritual, Pidikwe propõe um manifesto vibrante, onde celebrar é também uma forma de cura.
UÝRA: THE RISING FOREST de JULIANA CURI | Brasil • EUA | 2022 | Documentário • Performance | 1h 12min | M/6 | Português
Ao longo das margens do Rio Negro, na Amazónia, Uýra — artista indígena e bióloga trans — transforma o corpo num manifesto visual. Através de performances, palavras e metamorfoses vegetais, desloca-se entre comunidades, promovendo educação ambiental e antirracista, numa aliança entre saberes científicos e cosmovisões indígenas. Filmado com atenção sensível à floresta e às suas gentes, o documentário acompanha esse percurso como quem escuta: o som das águas, das folhas, da voz que conta e canta, que denuncia e reinventa.
Ujra: Nhe Pising Forest é um filme sobre transformação, resistência e reencantamento. Ao cruzar arte, ecologia e identidade, afirma a força dos corpos dissidentes e racializados como agentes de cura — de si e do mundo. Uma marcha orgânica contra as violências históricas e um recado urgente de que resistir também é cuidar e cultivar.

Domingo | 02 de Novembro 2025

THE BUILDING AND BURNING OF A REFUGEE CAMP de DENNIS HARVEY | Suécia • Irlanda | 2024 | Documentário | 21min | M/12 | Inglês
Na Irlanda, três homens erguem as estruturas mínimas de um campo de refugiados, à margem de uma socie- dade onde o direito ao asilo se vê ameaçado tanto por políticas excludentes como pela crescente violência da extrema-direita. A sua construção precária é um gesto de dignidade — e de denúncia. Quando o abrigo improvisado é queimado, o filme inscreve nesse mesmo ato de violência a metáfora dura e devastadora sobre o fracasso da Europa em garantir direitos humanos básicos aos mais vulneráveis.
The Building and Burning of a Refugee Camp confronta-nos com uma realidade que preferimos ignorar: a exclusão institucionalizada, o racismo quotidiano e a precariedade imposta a quem procura apenas viver em paz. Com uma linguagem direta e sem concessões, Dennis Harvey transforma o registo documental numa acusação feroz — e num apelo à responsabilidade coletiva.
MORIA SIX de JENNIFER MALLMANN | Alemanha | 2024 | Documentário | 1h 22min | M/12 | Grego • Persa • Alemão • Inglês
Após o incêndio que destruiu o campo de Moria, na ilha grega de Lesbos, em 2020, seis menores refugiados que ali estavam alojados foram acusados e condenados num processo judicial controverso, marcado por irregularidades e pressões políticas. O filme acompanha a correspondência entre a realizadora Jennifer Mallmann e Hassan, um dos condenados, revelando as falhas de um sistema que oprime em vez de proteger. Enquanto as chamas consumiram o campo, o silêncio sobre as condições desumanas e as expulsões ilegais na Europa permanece ensurdecedor.
Moria Six mostra, de forma íntima e crítica, a marginalização sistemática dos refugiados, evidenciando como as políticas europeias de acolhimento, em vez de cuidar e integrar, acabam por segregar e criminalizar os mais vulneráveis.
A FIDAI FILM de KAMAL ALJAFARI | Alemanha • Catar • Brasil • França | 2024 | Experimental • Arquivo | 1h 18min | M/12 | Arábe • Hebraico • Inglês
Fidai — do árabe, “Fedayeen”. Isto é: auto-sacrificado. Quando o exército israelita invadiu Beirute em 1982, tomou consigo o imenso arquivo do Centro de Pesquisa Palestiniano: fotografias, filmes, folhetos, registos áudio, etc. Décadas depois, Kamal Aljafari constrói este Film ‘em cima’ das imagens e sons roubados, através da colagem, pintura, deslocamento de sons e, sobretudo, pela rasura das inscrições em hebraico feitas sobre o material, catalogado lá atrás pelo IDF. Esta é uma ação sobre outra ação, um palimpsesto — e uma reivindicação pela memória do povo palestiniano.
A Fidai Film é, à letra, um corpo em movimento, um organismo trans, um direito ao lugar, e um filme que precisou de uma travessia para existir — um sacrifício. Numa edição onde se procura desdobrar a questão da migração, estamos perante um filme-fruto do que pode ser um desses mil movimentos.


UM CAROÇO DE ABACATE de ARY ZARA | Portugal | 2022 | Ficção | 20min | M/16 | Português
Larissa, uma mulher trans, e Cláudio, um homem cis, encontram-se numa noite em Lisboa. Entre conversas, silêncios e gestos partilhados, nasce uma ligação delicada que desafia expectativas e desarma violências. Filmado com atenção ao detalhe e à escuta, o filme recusa a pedagogia e o drama, propondo a ternura como forma de resistência, e o encontro como espaço político. Neste percurso noturno pela cidade, onde os corpos se revelam, se reconhecem e se protegem, Um Caroço de Abacate afirma uma outra narrativa: a da intimidade como possibilidade de reconhecimento e de cuidado.
Primeira obra de Ary Zara, Um Caroço de Abacate é uma história de empoderamento e ternura, um gesto poético que nos desperta para dias mais justos e habitáveis.
KOKOMO CITY de D. SMITH | EUA | 2023 | Documentário | 1h 13min | M/16 | Inglês
Retrato frontal e sem filtros de quatro mulheres negras trans nos EUA, Daniella Carter, Koko Da Doll, Liyah Mit- chell e Dominique Silver, Kokomo City é um documentário arrebatador sobre trabalho sexual, sobrevivência e poder. Primeira obra de D. Smith, artista trans e mulher negra, o filme rompe convenções formais com uma linguagem visual marcada por um preto-e-branco explosivo, montagem frenética e entrevistas que hipnotizam pelo carisma das protagonistas e crueza dos seus discursos. Ao dar voz a estas mulheres, escutando as suas dores, desejos e ironias, o filme confronta o racismo, a transfobia e o puritanismo da cultura norte-americana, ao mesmo tempo que destrinça e desmonta o projeto colonial branco e machista do Ocidente.
Kokomo City é um caleidoscópio brutal, terno e irreverente, do trabalho sexual — e reclama que o corpo trans, negro e marginalizado não só existe, como se recusa a ser silenciado.
BLACK GIRLS PLAY: THE STORY OF HAND GAMES de JOE BREWSTER e MICHÈLE STEPHENSON | EUA | 2023 | Documentário | 18min | M/6 | Inglês
Muito antes de chegarem aos palcos, rádios ou redes sociais, os ritmos do hip-hop já pulsavam nas mãos das meninas negras. Este documentário breve, mas vibrante, recupera a história dos hand games — jogos rítmicos de mãos praticados por meninas afroamericanas durante gerações, onde se entrelaçam corpo, voz, brincadeira e resistência cultural. Entre arquivo, performance e entrevistas, Black Girls Play mostra como estas práticas foram fundamentais para a formação de identidades e para a invenção de estilos que viriam a transformar a música e a dança. Ao mesmo tempo gesto lúdico e forma de expressão política, os jogos de mãos são aqui reconhecidos como herança e arte, revelando a criatividade negra feminina.
Black Girls Play devolve protagonismo a quem, tantas vezes, foi a origem invisibilizada de tanto do que veio a marcar a cultura popular.
MAJOUB’S JOURNEY de EVA KNOPF | Alemanha | 2013 | Documentário | 45min | M/12 | Alemão
Extraordinária história de Majub bin Adam Mohamed Hussein, nascido no então território colonizado da África Oriental Alemã, e recrutado como soldado pelo exército alemão na Primeira Guerra Mundial — com apenas nove anos. Sem receber o pagamento prometido, decide, anos após o fim do conflito, viajar até à Alemanha para reclamar o que lhe era devido. Lá, já sob o regime nazi, torna-se figura recorrente no cinema da época: motorista de Zarah Leander, criado de Hans Albers, ascensorista de Heinz Rühmann, etc., Majub foi o corpo negro presente nas fantasias coloniais da cultura visual alemã. No seu ensaio documental, Eva Knopf percorre os fragmentos de uma vida marcada por camadas de apagamento, exotização e violência simbólica.
Entre registos de arquivo e imagens de época, e através de uma lente delicada e crítica, Majub’s Journey observa, escuta e cuida. Um filme sobre quem é visto, como é visto, e o que é sistematicamente invisibilizado.
